segunda-feira, 6 de junho de 2011

CHARUTOS

Meu irmão José Luís almoça comigo nas segundas feiras. Temos hábitos alimentares diferentes, mas nas segundas feiras procuro fazer pratos que cubram essa diferença de gostos. Devo confessar que nem sempre tenho sucesso, pois minhas habilidades culinárias são precárias e o paladar dele, exigente.
Conversando com ele no sábado, falei da possibilidade de fazer charutos para o almoço de hoje. Meu distinto convidado apressou-se em recomendar:
- Use todos os temperos árabes que tiver... e não se esqueça de deixar uns quatro meio tostadinhos no fundo da panela.
Temperos árabes! Tenho pimenta síria, óleo de gergelim e cardamomo. Hortelã e cebolas nacionais. Salsa e cebolinha, idem. Tomates também.
Domingo de manhã fui ao Verdurão Parque comprar o repolho. Pesquisei nas prateleiras dos condimentos algum tempero pronto para kafta ou quibe, para dar um toque árabe. Não tinha. Quero crer que a Knorr ainda não produz esses sabores. O jeito é me virar com o que tenho. Mas não pretendo usar o óleo de gergelim. Usarei azeite de oliva. Aquele que foi motivo da briga com o meu amigo italiano. Mas isso é outra história.
Hoje acordei mais cedo que de hábito. Preparei o café da manhã com meus pensamentos totalmente voltados para o almoço. Nunca fiz charuto. Tenho uma vaga idéia da receita, mas sou ousada. Li algumas mensagens de auto-ajuda que afirmam que quando gente deseja intensamente uma coisa, o Universo conspira a nosso favor e essa coisa se realiza. Desejo fazer charutos, portanto vou conseguir. Pelos poderes da colher de pau, eu vou conseguir!
Foi nesse clima de auto-confiança que, por volta das dez horas da manhã, teve início uma odisséia na minha cozinha.
Primeiro foi o repolho. Tentei tirar uma folha que se partiu. A segunda também. Telefonei para a vizinha que é cozinheira profissional, pedindo instruções. “Tem que cozinhar o repolho inteiro e depois que as folhas estiverem macias, tirar cuidadosamente, uma a uma”. Anotado.
O repolho é enorme. Pego uma panela grande, encho de água e coloco para ferver. Assim que a fervura começa coloco o repolho lá dentro. A água transborda e inunda o fogão. Com muito cuidado para não me queimar todinha, levo a panela pesada até a pia e despejo o excesso de água. Enxugo o fogão e reponho a panela no fogo. Enquanto espero que ele fique macio, tempero a carne já moída. De repente me lembro que tinha de deixar o arroz de molho na água fervente (instrução número 2 da vizinha). Os poderes da colher de pau estão pifando. É hora de invocar Aladim ou a Jennie-gênio.
Nenhum dos dois na linha, esquento mais água para por o arroz de molho. Volto ao tempero da carne. Olho o repolho. Ponho o arroz de molho. Penso que uma omelete seria o ideal para o almoço. Ou ovos fritos. Mas é tarde para voltar atrás. Já que é tarde, tomo uma xícara de café – sentada que é para relaxar. Coloco um CD da Rita Lee para melhorar o astral e ouço “que tal nós dois, numa banheira de espuma...” Tudo o que eu preciso: um banho relaxante, numa banheira de espuma. Ficar de molho... Molho? Ai meu Deus! O repolho! Olho. Cozinhou demais. As folhas estão transparentes. Tiro a panela rapidamente do fogo e despejo tudo na pia, rezando para o repolho não esborrachar. Prece atendida. Resfrio o repolho ardente debaixo da torneira para poder manuseá-lo. Manusear, no caso, significa pegar folha por folha e cuidadosamente tirar o talo de cada uma delas, fazendo uma pilha de folhas destaladas que serão recheadas com a mistura de carne e arroz. É claro que esqueci o arroz de molho. Largo o repolho e escorro a água do arroz e misturo com a carne. Minha fada-madrinha! Onde estás? Tomo a decisão de me tornar radicalmente vegetariana. Ou de telefonar para disk entrega do restaurante Cedro do Líbano na próxima vez que resolver comer charutos.
Só não choro porque a Rita Lee não deixa. Estoicamente (aprendi essa palavra na Escola Normal, com o professor Marcelino que não sabia nada de filosofia, mas tinha uma linda voz de barítono), começo a encher as folhas de repolho com a mistura e fechar os pacotinhos que deveriam ter a forma de charutos. Sem muito sucesso. Alguns pacotinhos ficam meio rasgados. Tudo bem. Explicarei para o meu irmão que se rasgaram durante o processo de cozimento. Uns vinte pacotinhos depois, os charutos estão prontos para a panela. O mais difícil está feito. Nem preciso me preocupar em deixar uns quatro mais tostadinhos no fundo da panela. Minha comida sempre queima mesmo. Tiro a Rita Lee do aparelho de som e coloco Haendel. Aleluia!


(Marisa)

Um comentário:

  1. Boa sorte!
    Bom final de semana e brigaduuuuuuupela visita.
    Bjus em seu coração

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